27.12.07

GATO NO SOFÁ III


A FRASE

“Os americanos e os europeus (…) compreenderam que se os chineses vêm de tão longe para trabalhar na África, emprestar-lhe dinheiro, comprar e vender mercadorias, eles encontram um interesse que eles mesmos tinham subestimado. Como é evidente, este continente ‘vale’ alguma coisa. E depois dos chineses terem vindo para África, a Índia e o Brasil procuram fazer o mesmo, os EUA preocupam-se por estar cada vez mais presentes, como a Alemanha e a EU”
Béchir Bem Yahmed, fundador do grupo “Jeune afrique”, na “La Revue”, nov/dez 2007-12-26

O Estado e a sociedade civil
Portugal nunca teve o Rei Sol, mas Sócrates está a ver se consegue ser o “primeiro-ministro micro-ondas”, tão quente é na defesa do conceito do “Estado sou eu”! O discurso de Natal foi a mais desvanecedora massagem ao próprio umbigo que me lembro ouvir. Até não se poupou dizer que quase não dormia por causa dos desempregados e que o défice estava controlado. Como? Por o Estado ter apertado o cinto? Não. Porque os impostos garantiram mais impostos. Apetece sempre citar Eça de Queiroz: “Temos um défice de 5000 contos. Esta é a negra, a terrível, a assustadora verdade. Quem o promoveu? Quem o criou? De que desperdícios incalculáveis se formou? Como cresceu? Quem o alarga? É o governo? Foram os homens que combatem, foram aqueles que defendem, foram aqueles que estão mudos? Não. Não foi ninguém”. Isto escreveu Eça em 1867. Estamos em 2007. O que mudou? É o contribuinte que paga o desaforo.

Um exemplo
O SNS é um buraco negro. Para pagar as dívidas, pede dinheiro ao Estado. Para pagar ao Estado, no fim do ano, pede à banca. No início do ano paga à banca, com juros. Para voltar a ter dinheiro, volta a pedir ao Estado. E vai alargando o buraco. Não sou eu que diz. É o Tribunal de Contas? Será que é isso que preocupa Sócrates no Natal?

A GRALHA DA GAFFE
O ministro da Administração Interna, Rui Pereira, deu uma entrevista ao jornal do PS, o “Acção Socialista”. É normal. Segundo parece o ministro referiu que o problema da criminalidade da noite do Porto não é “real”. O alvoroço estalou e os profissionais da má-língua dispararam sobre o ministro que fez um tirocínio breve pelo Tribunal Constitucional antes de ceder ao canto da sereia do Governo. Mas era uma maldade! Não é que, esclarece o ministro, não foi isso que ele disse ao órgão oficial do PS: foi uma gralha. O que o ministro Pereira terá dito é que o problema não é “geral”, esclareceu o próprio. Não se compreende: segundo o ministro Pereira a culpa de tudo é da “mediatização”, dos jornais e televisões, portanto. Mas será que há uma quinta coluna no órgão oficial do PS, que é o partido do Governo? Nem em casa o ministro Pereira escapa às maléficas actividades dos “media”…

Pássaros no Campo das Cebolas
Há dias dei por mim a andar junto do Campo das Cebolas. Ouvi o chilrear e olhei para as palmeiras que resistem ao betão e às obras do “seguríssimo” Metro do Terreiro do Paço. Milhares de pássaros conviviam uns com os outros, criando momentos únicos de prazer na cidade do “stress” e do ruído. Ainda há coisas bonitas em Lisboa. Que nos fazem acreditar nesta cidade.


Chineses sem Chinatown
Descobri, ao pé de mim, uma nova loja chinesa. Não é de produtos desconhecidos. É de legumes e frutas. Frescos. E extremamente baratos. São adquiridos no mesmo local onde os outros comerciantes compram mas os preços rondam entre a metade e os 2/3 do que custam noutras mercearias ou supermercados. Está sempre cheio. Temo que a ASAE passe por lá.

Millennium sempre!
Não, não tem nada a ver com a crise da maior instituição financeira privada portuguesa. A crise, aqui, é outra: tem a ver com a da sociedade. “Millennium” foi uma série de Chris Carter, que devia algo a “Profiler”, sobre um agente reformado do FBI, Frank Black, que tem o dom de “ver” o que pensam os “serial killers” com que tem de se deparar. A primeira temporada saiu agora em DVD no nosso país. E é um prazer.

VINHOS SENSATOS
Há vinhos que merecem ficar num trono: os Portos por exemplo. Que dizer do Late Bottled Vintage 2001 da Graham’s? Um néctar de tal maneira agradável e de uma leveza única que é impossível ficar indiferente a ele. Na noite de Natal todos o elogiaram.
E há o Quinta da Ervamoira Vintage 2005. Outro grande vinho do Douro para adoçar longas noites de conversa. Elegante e cuja cor faz-nos lembra o outro lado do mundo: o secreto, o Nero, o qu não se vê. Só se sente.

Há culpados?
“A Culpa dos McCann” (ed. Guerra & Paz) é uma bem estruturada obra de Manuel Catarino sobre o caso Maddie, onde há ainda muito mais dúvidas do que certezas. Logo no início explica-se o mistério entre da intriga: “Se o desaparecimento de Maddie fosse a trama de um romance de Agatha Christie, Hercule Poirot teria reunido o casal McCann e os sete amigos britânicos à beira da piscina do Ocean Club - e, de raciocínio em raciocínio, em menos de um fósforo, resolvia o mistério”. Não foi assim. E, lendo-se este livro, percebe-se porquê.
O Anúncio
No “Financial Times” de 21 de Dezembro lá está o anúncio: a Sonangol convida companhias para novas concessões de petróleo em Angola. Para diversos blocos, do “onshore” de Cabinda ao Kwanza “onshore”. As propostas serão abertas a 14 de Março de 2008. Pormenor que não é curioso, mas de sublinhar: as propostas devem ser apresentadas em português ou, se forem feitas noutra língua, devem ter uma versão oficial em português. Entre as 43 operadoras pré-qualificadas lá está a GALP. Com muitos pesos-pesados à volta.

A crónica
Tornei-me um fã das crónicas de Bárbara Reis no “Público”. São incisivas e refrescantes. Sinto que merecia escrever mais do que a sua solitária crónica semanal.

25.12.07

DARTH VADER ANDOU PELO BCP?

Durante anos o BCP foi o quartel dos mais afamados guerreiros Jedi do sector financeiro português. Mas na sede do exemplo do novo Portugal, empreendedor, renovador, modernista, foi-se tecendo uma nova aliança: a do seu arquitecto maior (Jorge Jardim Gonçalves, quase o senador Palpatine do BCP), com os guerreiros Sith. O objectivo, simpático, no irresistível apelo do sucesso sem limites, era tornar a república (onde os accionistas eram mais importantes do que os executivos) num império onde os eleitores se subordinavam às ordens de alguém mais apto. Tudo correu bem até à sucessão. Quando o pretenso Darth Vader (Paulo Teixeira Pinto) se rebelou contra os Sith, foi imolado. Mas isso fez com que os Jedi restantes (à frente dos quais Joe Berardo) se revoltassem. A Berardo a democracia deve o regresso da capacidade de inquirir e não se calar. A “pax jardiniana” tornou-se então um dilema para a sociedade portuguesa. Especialmente quando as denúncias sobre irregularidades ultrapassaram a barragem do núcleo de decisores do BCP.
Mas é aí que os mistérios se tornam um enigma maior. Durante anos o núcleo decisor do BCP reforços as teias do poder eterno, perante a displicência do Banco de Portugal (como se percebe agora – a despropósito: porque é que o célebre inquérito, feito há dois anos, foi arquivado?) e a distracção da CMVM. Mas, neste momento, há questões mais inquietantes. Sempre existiu (e não é desde o 25 de Abril, é desde o tempo da monarquia, e dos célebres monopólios do tabaco) um acordo de cavalheiros e de interesses entre o Estado português e alguns dos empresários nacionais. Isso criou uma situação de dependência cruel para a sociedade civil portuguesa. Sem uma classe empresarial livre da tutela político-partidária do Estado, este país continuará a cantar um fado miserabilista.
A crise do BCP poderia ser o grito do Ipiranga da comunidade empresarial nacional face ao Estado. Mas teme-se que tal não venha a acontecer. O apetite partidário, feito à custa da “ajuda” do Estado ao maior grupo financeiro privado nacional, mostra como os partidos do “centro” político e de interesses olham para a sociedade civil portuguesa: como moços de recados. Nem se fale da tentativa de colocar Armando Vara no BCP, ou na desastrada resposta de Luís Filipe Menezes de pedir a CGD para o PSD. Quando os empresários portugueses se auto-silenciam face a este desaforo (e isto não tem nada a ver com as boas relações que podem e devem ter com o Estado, como ente público mas não partidário), sente-se que Portugal pode perder o seu gosto pela liberdade de cada um decidir.
No seu livro mais estimulante, “Victory” (em que, nem por acaso, parte da intriga se passa numa Timor recheada de portugueses), Joseph Conrad escreveu: “The world of finance is a mysterious world in which, incredible as the fact may appear, evaporation precedes liquidation. First the capital evaporates, and than the company goes into liquidation”. Não é esse o perigo do BCP: ele não será liquidado financeiramente. O problema é se ele não está a ser liquidado moralmente por presumíveis culpados e pretensos salvadores. E sobre isto, lembremo-nos, o que pensam os milhares de anónimos depositantes do BCP, a parte mais esquecida de todo este enigma?

20.12.07

Veiga, o Harry Potter do Benfica?


José Veiga, aparentemente, quer ser o Harry Potter do Benfica. É um pensamento meritório. Nada que outros já não tivessem tentado, de Vale e Azevedo a Luís Filipe Vieira. Mas nem todos podem ser Borges Coutinho. Embora, compreensivelmente, tentem. É o caso de Veiga, que tenta criar o mito de que ele pode ser o “special one”: “esta é uma das marcas que mais diferencia os actuais gurus da liderança mundial no futebol: o modo implacável como separam o trigo (da unidade colectiva) do joio (do egoísmo individual). É assim José Veiga, é assim José Mourinho, e são assim todos os líderes que seguem escrupulosamente os mandamentos de uma relação no balneário sem protectorados nem discriminações”. Veiga, nota-se, quer. Mas entre o querer e o ser, há algo que os chineses compreendem como ninguém: é preciso paciência. E isso Veiga não tem.
O livro percorre a vida do empresário (desde que cresceu “a pulso” na vida até ir para o Luxemburgo e daí até à sua ligação a Pinto da Costa e a sua posterior ida para o Benfica). É muito bem escrito, por Camilo Lourenço e José Marinho. Desvenda Veiga onde ele pode brilhar. Esconde-o, onde ele dificilmente se poderia defender. Só um exemplo: o ex-jogador do Benfica, Tiago, é citado a propósito da sua compra ao Braga (por Veiga) e da sua venda ao Chelsea (por Veiga, supõe-se). Sobre as razões porque Tiago saiu do Benfica, a história foi reescrita pelo empresário de futebol. Há momentos de glória (Figo, as ligações a Joaquim Oliveira, a influência no futebol europeu…) que são bem assinalados. E há, claro, a conquista do campeonato em 2005 pelo Benfica. Segundo o livro, isso derivou da mudança de hábitos – “por detrás desse trabalho estavam dois homens: José Veiga, o director desportivo do clube, e o Giovanni Trapattoni, o treinador”. Este fora uma “escolha pessoal” de Veiga, como não poderia deixar de ser. E, no livro, em troca, elogia Veiga vezes sem conta. Mas não nos iludamos: José Veiga não é o James Dean de “Rebelde sem Causa” nem o Benfica faz de Nathalie Wood neste filme.
Pinto da Costa é o inimigo principal de Veiga. Luís Filipe Vieira, que não sabendo nada de futebol, lhe espetou uma faca nas costas, é o inimigo secundário. Com a diferença que é líder do clube de que Veiga quer ser presidente – o Benfica. “Os ensinamentos de Pinto da Costa eram o manual de procedimentos mais avançado que José Veiga podia ter, para entrar nos esquemas mais intrincados do futebol”, refere-se no livro. Fica-se na dúvida: mas o que se pretende para o Benfica, ter um Pinto da Costa vermelho, ou ter uma outra visão do futebol, como espectáculo (e, mesmo, como negócio)? Para Veiga o importante é uma “estrutura forte”. Para isso é preciso combater o sistema “e eu conheço-o bem, porque estive lá dentro” – se voltar, promete, dará a estocada final no sistema. As opiniões recolhidas, nem por acaso, são todas elogiosas. Compreende-se: este é o livro que pode fomentar o regresso, qual D. Sebastião, de Veiga ao Benfica. Claro que há um entrave: Vieira. Refere-se no livro: Luís Filipe Vieira “não tem sensibilidade para as questões do futebol (…) é por isso que o Benfica não ganha”. É aí uma das lacunas mais visíveis da obra: tudo gira à volta de dirigentes executivos e não de jogadores – peças de um mercado onde obtêm a glória, mas onde muitos interesses se movem por detrás. Desses, Veiga não fala. Mas Zahovic diz tudo por ele: “se um jogador passar uma informação para os jornais, de certeza que o Veiga vai ser o primeiro a sabê-lo. Tem tudo controlado”. Não se percebe: Veiga controla os jornalistas, as linhas telefónicas da PT, os jornais e páginas desportivas? Será um elogio ou uma crítica camuflada? A criadora de moda Coco Chanel dizia:”Balenciaga é único. Os outros são meros desenhistas”. Veiga, neste livro, parece ser o desenhador perfeito. Mas sê-lo-á?
O Benfica é uma cereja do cimo do bolo. Todos a querem comer. E isso não é um pecado de Veiga. O Benfica poderia, se quisesse, ser o esperanto futebolístico de Portugal: a linguagem, a cor, a marca, que todos gostariam de referenciar. Em Portugal. Nos EUA, na África do Sul, na Venezuela, em França, no Japão (imagine-se, nas vésperas do Mundial da África do Sul, em 2010, uma “tournée”, um ano antes, do Benfica a Joanesburgo, à Cidade do Cabo e, depois a Angola e a Moçambique…o que seria)? Um golpe de génio?
Qual é a fórmula para dirigir um clube? Veiga dá 10 mandamentos, onde o papel do director desportivo é fulcral. Eu modestamente acrescentaria: explorar as ineficiências do mercado de transferências; substituir os melhores jogadores, antes de vender estes; compre-se brasileiros ou africanos, ajude-se à sua adaptação, dê-se aos jogadores das escolas as mesmas oportunidades que se dão aos adquiridos (veja-se o caso vergonhoso de Moreira no Benfica); cresça-se devagar sem dívidas colossais; as transferências devem ser decididas por quem faz parte da estrutura profissional de um clube e não por quem está de passagem (a começar pelos treinadores e muitos dirigentes). Mas como isso não sucede em Portugal, todos podem sonhar. E, neste livro, o sonho ainda comanda a vida de José Veiga.

GATO NO SOFÁ III


A FRASE
“Sendo Portugal um país altamente dependente dos fluxos de capital externo e com elevadas taxas de endividamento que, no caso dos particulares, já atinge 124% do rendimento disponível, o que associado à tendência de aumento da taxa de desemprego que, no terceiro trimestre, andou pelos 8%, sendo uma das mais elevadas da União Europeia, dá ideia das dificuldades do país para manter níveis de crescimento do consumo e do investimento que possibilitem a progressão do PIB”
José Silva Lopes, carta aos ASSOCIADOS do MONTEPIO GERAL, Novembro de 2007

Policía secreta cor-de-rosa

Sócrates, um dia destes, escreve o seu auto-elogio. Estilo uma auto-entrevista, em que ele formula as questões e depois, humildemente, diz: Ainda bem que me faz essa pergunta. O Primeiro-ministro está ufano com o fortalecimento da UE! Há-de seguir os passos de Guterres e Barroso. Mas, por cá, no “País tecnológico” reparamos que a taxa de penetração da Internet de banda larga é inferior à de potentados como a Letónia e a Lituânia. Porquê? Porque, em Portugal, para se ter a tecnologia que nos terá mais competitivos cada português terá de gastar mensalmente três por cento do salário médio. A Justiça também é uma preocupação do Governo e é por isso que a PJ do Porto se rebela e o ministro da pasta parece Pilatos. Como se não bastasse, o célebre caso do FSE/UGT, que se arrastou 20 anos pelos tribunais, acabou devido a prescrição. Ao “Caso Casa Pia” estará reservado o mesmo fim? Mas, convenhamos, Sócrates lê. Nas ultimas semanas, se o “jet-lag” de tanta viagem não o afectou, deve ter lido com atenção Aldous Huxley de “Admirável Mundo Novo” e “O Triunfo dos Porcos” de Orwell. Só assim se compreende A nova grande reforma do governo: a promoção da delação. O Sistema de Queixa Electrónica, criado pelo Ministério da Administração Interna, é a polícia secreta “Cor-de-Rosa” (a verdadeira ideologia socrática) feita em estilo “Paparazzi” por todos os cidadãos. Estaline não teve um gosto tão popular…
Desculpem a questão envergonhada: o “núcleo duro”de Sócrates não se parece, cada vez mais, com um comité central dos “bons velhos tempos” do PCP?

A ubiquidade
Edite Estrela tornou Sócrates um Deus. “Parece que tem o dom da ubiquidade”. Governa na Europa e em Portugal, disse a formosa euro-deputada, que sabe como se deve escrever em português. Mas há algo que me intriga: ubiquidade quer dizer estar para aí em dois lados ao mesmo tempo, não? Na Europa ainda entendo: ele esteve lá, distribuindo sorrisos e recebendo elogios. Mas, em Portugal, alguém tem visto sinal de uma obra sua, para além das “tecnologias”? Só mesmo Edite Estrela, que, segundo consta, frequenta mais a UE do que este sítio…

ARRÁBIDA sempre
Passei lá muitas das férias da minha infância. Olhava para o portinho, ia apanhar polvos num barco a remos, via as senhoras a trazerem uma vez por semana as suas frutas e hortaliças em burros. Mas era sobretudo a beleza natural da Arrábida que nunca esqueci. Até quando ainda como um mel fabuloso, de urze (oferta generosa do Octávio Ribeiro) sinto o aroma e a beleza daquela serra única. Que continua a ser destruída impiedosamente por quem come as areias das suas entranhas. É uma morte anunciada. Sob o olhar e o silêncio de um Governo que se diz amigo da ecologia .

Lisboa LIMPA
Lisboa está cada vez mais suja. Agora que passeio pelas ruas a pé, noto a falta de limpeza. E, como se sabe, quando as entidades camarárias não promovem a limpeza, todos acabam por deitar mais um papel para o meio do chão. Sei que o orçamento é escasso, mas, caro António Costa, Lisboa Limpa não é uma forma de também tornar uma cidade mais iluminada para alfacinhas e VISITANTES?

FILME – Control
É um filme sobre a minha juventude. Sobre a Joy Division, sobre o desespero dos jovens suburbanos, como Ian Curtis, como muitos dos que cresceram comigo no Barreiro. Recordo, ao ver o filme de Antón Corbijn, os belos textos de Miguel Esteves Cardoso, nos anos 80, no “se7e”. E, claro, os sons da Joy Division, da Durutti Column, dos New Order. Ainda hoje.

SÃO FRANCISCO XAVIER sonoro
Foi uma surpresa. Descortinei-o numa discoteca e tenho-o ouvido vezes sem conta: “La ruta del Oriente” dos Hespèrion XXI e da La Capella Real de Catalunya de Jordi Savall. Uma edição discográfica fabulosa (com dois CD e um livro), sobre a vida de São Francisco Xavier, especialmente no Japão. A vida de um missionário portugués. A edição mostra algo muito curioso: a importância que Portugal dá à sua história. Tudo veme m castellano, em francês, em inglês, em alemão e, claro, em catalão. Em português não. Há um Ministerio da Cultura neste país? Ou é uma ficção da nebulosa socrática?


MAIS PLUS
Fui pela primeira vez aos supermercados Plus. E deparei com a marca Casa de Pasto, lançada este mês, onde um galo mostra o que há de bom em Portugal: do azeite, aos queijos e aos doces, e passando pelo peixe e pela padaria. Coisas boas a preços convidativos. Vale a pena

SEMPRE A HORAS
A Boutique dos Relógios editou um livro magnífico de Fernando Correia de Oliveira: “Dicionário de Relojoaria”. O tempo, os homens que fizeram com que compreendessemos o seu valor, ali está, contado ao sabor de uma pena muito bem informada. Para ler com tempo. E para aprender que o tempo não é infinito.

Kaká Sempre
Os portugueses podem ter ficado magoados. Cristiano Ronaldo não ganhou o troféu da FIFA para o melhor jogador do mundo. Ganhou Ricardo Izecson dos Santos Leite, vulgo Kaká, e venceu bem. Ninguém quer acreditar que um jogador filho da classe média de São Paulo (o atípico futebolista, que é quase sempre de classes pobres). Evangélico, Kaká é olhado de forma desconfiada pelo mundo do futebol. Mas vê-se nos seus olhos o brilho da sua alegria de jogar e de criar magia nos estádios. Diga-se em abono da verdade outra coisa: a melhor do mundo foi, em futebol, uma brasileira: Marta, que é filha de uma família muito humilde de Alagoas. Juntos, no palco, disseram uma coisa simples: todos podem obter o que desejam.

12.12.07

gato no sofá II

A FRASE

“For the markets, rate cuts ae like a drug. They can inspire euphoria, but can also induce dependency. Markets, like addicts, need bigger and bigger doses to get the same effect”.
John Authers
Financial Times


E as crianças, senhor engenheiro?

Os directores das escolas vão ser escolhidos por concurso: essa é a boa nova de Sócrates aos portugueses. Trocando por miúdos, o primeiro-ministro faz como David Copperfield: ilude com um truque. Os problemas das escolas (falta de qualidade do eu é ensinado, ausência de poder dos professores) continuam. Muda a gestão: porque é apenas a questão dos números que aflige Sócrates. Os números para a EU, os números para não se gastar muito em cada escola. E, depois, fala-se na qualificação. O Governo descarta clpas, os pais passam-nas para os professores e estes ou estão calados ou vão para o quadro de adidos. E as crianças, senhor primeiro-ministro?

OTA e ALCOCHETE: NIM?

Segundo parece o relatório vo LNEC vai ter uma rsposta às questões do Governo: Nem sim, nem não – Nim? É a forma suave do LNEC dizer: “não me comprometa”. E deixar nas mãos do Ota-dependente Mário Lino e do ministro do Ambiente a guerrilha pelas suas damas, antes de Sócrates, e só ele, decidir obra do regime. A despropósito: depois disto, para que é eu vale a pena fazer a monstruosidade do TGV?

Mourinho e a Inglaterra

Mourinho gosta de Inglaterra. Mas ama muito mais a liberdade e o futuro. Liberto de Abramovich quer ir para Itália ou para Espanha. Afinal só tem 44 anos. Para fazer os ingleses jogarem 10 vezes por ano, basta-lhe um Fábio Capello. Como já dizia Arsène Wenger: o futebol de selecções pertence ao passado.

AS ELEIÇÕES

De um lado está Hillary Clinton. Do outro Barack Obama. Ambos querem ser os candidatos democratas para ocupar o trono da Casa Branca. Hillary conta com o apoio do escritor John Grisham. Obama com o mais mediático aplauso de Ophrah Winfrey. Na idade da imagem, esses apoios valem votos. Mas as contas podem ser outras: se Hillary ganhar haverá um presidente da família Clinton durante uma série de anos. Como de resto sucedeu com a dinastia Bush. Todos diferentes, todos iguais?

Azeite é vida

O azeite é um daqueles produtos que tem a ver com a nossa cultura. Embora, muitas vezes, o desprezemos. Em Malta ou Itália, quando se vai a um restaurante, lá está ele na mesa, num pratinho, para se molhar com um belo pão. Aqui não. Surge vagamente, e muitas vezes de má qualidade, nas sopas ou pratos. Agora o bom azeite foi afastado dos restaurantes, presos às garrafinhas higiénicas que o Estado impõe para salvaguardar a nossa saúde. O que vale é que, agora que o bacalhau regressa aos nossos pratos, a Gallo surge com umas belas garrafas de azeite Novo da colheita de 2007-2008. É delicioso e deve-se utilizar generosamente.

Os azares da ASAE

A ASAE, dizem, está a defender como Batman, os consumidores portugueses das tentações que o Joker nos quer impor: bolas de Berlim, ginja, pastéis de massa tenra, migas feitas com pão de vários dias (as únicas que são saborosas). Tudo nos pode fazer mal. Portugal está assim a deixar de ter os seus prazeres e tentações. Mas a gloriosa ASAE não vai aos templos do fast-food. Que tal irem, por exemplo, às Amoreiras onde os hambúrgueres e as batatas fritas são verdadeiras misturas de sal com algo à volta? Isso a ASAE não vê. Porque seria meter-se com as multinacionais liofilizadas. Tudo em nome da lei e da domesticação da nossa liberdade. Se fosse em Espanha, a ASAE bem podia ir fazer investigações às tapas e os museus del jámon…

Livro bem disposto

Maria João Matins traz-nos uma deliciosa obra de ficção: “Escola de Validos” (edição Teorema), um romance que recupera um período crítico da nossa história – o da restauração. Na corte portuguesa todos se movem para ter um pedaço de poder e isso é retratado, fielmente e friamente, pela autora, que não rsiste a citar António Vieira: “não me temo de Castela, temo-me desta canalha”. É uma grande lição de história, mas também de qualidade de escrita. Um bom livro para ler nos alvores do novo ano.

BD total

Ando a refazer a minha colecção das aventuras de Steve Canyon, o militar norte-americano, que foi criado por Milton Caniff. Para lá da ideologia, é uma das BD mais carismáticas de que há memória (Hugo Pratt sabia onde ia beber Corto Maltese). Posso assim deixar de continuar a armzenar velhas Mundo de Aventuras que custam uma fortuna nos alfarrabistas. E estes livos são com as iras originais…

DVD

Comprei a versão remasterizada de “Blade Runner”, o filme de Ridley Scott baseado no livro de Philip K. Dick. É um prazer olhar para o mundo do futuro e sentirmos que estamos a caminhar para lá, mesmo não colocando “replicants”, porque já temos humanos demasiados para o trabalho existente. Onde está Malthus?

6.12.07

O GATO NO SOFÁ


As doenças são assim: atiram-nos, sem perguntarem se queremos, para a cama. Ou para o sofá. De lá vemos de outra forma o mundo. Com outras cores, como se fosse um arco-íris, do mais alegre ao mais sombrio. Durante algumas semanas é daqui, deste lugar confortável, que olho o mundo.

A FRASE

“A nossa calamidade natural não vem de Deus ou da terra, mas dos políticos de Brxelas”.
Gino Mazo, habitante de Decimoputzu (Sardenha), no Financial Times


A zanga de Merkel

Ângela Merkel está furiosa. Tudo por causa do salário de Wendelin Wiedeking (o novo director da Porsche), que vai auferir 60 milhões de euros por ano. Disse a chanceler alemã: “Lá porque um executivo de uma empresa de carros americanos ganha milhares de vezes mais do que um empregado”, um executivo alemão não deve ir no mesmo comboio. Em Portugal, pia-se mais fino.

Marcha de Lisboa

António Costa livrou-se da canga Sócrates e foi para a CML. Lá encontrou o PSD, que tenta que ele não peça 500 milhões de euros para pagar dívidas a fornecedores. Jogos políticos, em suma. Mas não imaginava que o PSD fosse tão cioso, nesta fase de partido-empresa, da defesa do Estado. Afinal, ainda há uns dias, uma senhora de uma loja de quadros mostrou-me uma factura de 500 contitos (dos antigos) que a CML lhe deve há 5 anos. O acordo ficou por 400 milhões, ao que parece. Costa, como bom diplomata, viu o furo da agulha do PSD. E lá se conseguiu salvar Lisboa de mais um desastre anunciado.

CONRAD com 150 velas

Joseph Conrad é um dos meus escritores preferidos. Faz agora 150 anos que nasceu e, ao recordá-lo, lembramos que ele nunca acreditou que a literatura trouxesse a verdade. Não se podia confiar nela, dizia, com toda a razão. Auden também disse que a poesia não levava a que algo acontecesse e Adorno, para rematar, considerava que, depois de Auschwitz, não havia espaço para a poesia. É capaz de não ser bem assim, mas Conrad escreveu sobre a duplicidade como nenhum outro – lembre-se “O Agente Secreto” ou “Heart of Darkness”, onde Marlow diz de Kurtz: “We live, as we dream – alone”. Vamos relê-lo?

África em Lisboa

Paninhos quentes é o que Sócrates e muitos Ferrero Roche para distribuir pelas delegações e evitar mais enjoos entre Gordon Brown e Mugabe. Mas o reencontro entre África e a EU é sobre economia e muito pouco sobre política: ou melhor, é real politik. Não é por acaso que a EU e a China se dão tão bem. E a China tem tanto poder em África…

POP NO AR

No YouTube descobrem-se coisas maravilhosas. A minha nova fixação não é a entrevista de José Sócrates aos Gato Fedorento, a humilhação suprema do líder que nunca se engana. Não: são os St Vincent, ou melhor, Annie Clark uma texana cujo primeiro álbum se chama “Marry Me”. Temas como “Landmines” (estilo trip-hop) ao muito folk com timbres que lembram Kate Bush misturado com Beck, há de tudo. Belo.

Como não posso sair de casa à noite não pude ir ver as Au Revoir Simone ao Santiago Alquimista. A sorte é que tenho o disco, “The Bird ofMusic”, um clássico das três meninas que incendiaram os corações de David Lynch e Sofia Coppola. Ao lado tenho o primeiro disco de Virgínia Astley. Que beleza!


Sopranos omertà

Em “Omertà”, o ultimo livro de Mário Puzo (“O Padrinho”), ele fala da lei do silêncio no mundo corrupto em que se movem os mafiosos. Agora que terminou, na RTP2, esta semana “Os Sopranos”, uma das mais fabulosas séries sobre este mundo, apece percorrer o caminho de volta. Tony sobrevive, num mundo em que a família da máfia se depara com os mesmos problemas de todas as outras – o crescimento dos filhos, a crise conjugal, etc. Esse foi um dos segredos de “Os Sopranos” - família corrupta que vive ao nosso lado. Que mata, mas ninguém vê. O criador dos Sopranos, David Chase, acabou a série que abre todas as portas. É uma verdadeira caixa de Pandora. Depois da chacina, à sua volta, a família Soprano está novamente com os seus problemas: AJ destrói o seu SUV, enquanto ouvem Dylan e se preparam para o sexo, quer ir para o exército e aprender árabe. Tony espera pela família no restaurante e, na jukebox, coloca “Don’t Stop Believin’”. Meadow está a chegar? A sexta série fecha um ciclo: a ascensão e queda (aparente) de Tony Soprano. Tudo tem de ser como é. Inevitavelmente. Do poder sobra o sonho. É talvez essa a grande lição de Tony Soprano aos aprendizes de política dos dias de hoje.

O CHÁ DAS CINCO

À tarde, pelas cinco, gosto de fazer chá. Perfeito, verde, com ginseng, com aromas orientais, da China, do Sri Lanka, do Vietname. GAgora descobri, no El Corte Inglês, uma nova marca inglesa: Dr. Stuart. Relaxante. De um médico botanista para o nosso prazer.

Revista fabulosa
A Interview de Novembro coloca na capa Nicole Kidman e Jennifer Jason Leigh. No interior elas são entrevistadas por um dos grandes escritores do nosso tempo, Michael Cunningham. “Margot at the Wedding”, o filme onde participam, é a razão de ser deste destaque. Nicole diz: “I believe in a little discretion, I’d rather use no words, a lot of times”. Que se espera, numa entrevista onde se fala de Madame Bovary, do Zen e de jardins…

Giro matinal

Todas as manhãs saio para ir comprar os jornais do dia, mais algumas coisas que me iluminam os olhos – uma garrafa de agua de coco brasileira, por exemplo. Passo junto à Sopa dos Pobres, onde dia após dia, a fila parece mais comprida. Não são só sem abrigo nem “agarrados” que lá estão. São pessoas simples, que deixaram de ter trabalho, porque não têm as qualificações que o regime pensa que devem ter (quando é que os serviços do Estado percebem que a pior faixa para voltar a colocar no circuito de emprego é a entre os 45 e os 55 anos?). Chama-se a isto a pobreza de um país tecnológico.

2.12.07

D'AQUÉM E D'ALÉM MAR 2


Há filmes que são verdadeiras histórias cruéis sobre o poder e a solidão que criam à volya de quem o detém. A Maldição da Flor Dourada de Zhang Yimou é de uma beleza fantamasgórica, com uma riqueza estética única e com um argumento que poderia ser transplantado da dinastia Tang chinesa para qualquer período da história. Mesmo actual. Gong Li e Chow Yun Fat dão corpo a esta história de segredos, traições, golpes palacianos e de mortes pelo veneno que são aceites por quem deve morrer. Uma lição sobre o poder e o seu exercício. Que agora revi em DVD.

VINHOS DE JANCIS

Jancis Robinson, neste Financial Times de sábado, recomenda 60 vinhos tintos para a quadra natalícia. Alegria: dois são de origem portuguesa. O divino Poeira 2004 do Douro de Jorge Moreira, que merece ser conhecido e recomendado. E o Churchill Estates 2005 Douro, que nunca tive a honra de sentir o aroma. Mas é para registar.

1.12.07

D'AQUÉM E D'ALÉM MAR


Nestes dias junto ao sofá continuo a ouvir, sem interrupções, uma grande canção: Quand tu ne m’aimeras plus de Jerome Attal com a voz perturbante de Melánie Jaubert. Consigo escutá-la 24 horas por dia. E é pouco! Num dia após greve, aquela que o Governo diz que só foi frequentada por 20% de funcionários, é obra! Cantemos, pois. Contra o estrangulamento da sociedade.

BOA NOTÍCIA

A Folha de S. Paulo (edição internacional) voltou a estar à venda em Portugal. Não a lia em papel desde a década de 80, quando era um jovem jornalista do Semanário, e me vi (com Eurico de Barros) na contingência de tomarmos conta do MAIS Semanário (suplemento cultural), após a debandada de chefes para o novo projecto de Robert Maxwell com o PS, que seria um diário chamado 24 Horas dirigido, falava-se na altura, por Carlos Cruz (resultado: Maxwell caiu do seu veleiro e afogou-se, o PS deu um passo à frente e dois à retaguarda e saiu a revista Face) . O director, o saudoso Vítor Cunha Rego, chamou-me um dia ao seu gabinete, eu tremi como varas verdes, e ele sossegou-me. Disse-me: Fernando, se tiver algum problema, tem aí a Folha de S. Paulo, de que temos o exclusivo. Nas próximas semanas, até se refazer a equipa, utilize-a à vontade. A Folha tornou-se, para mim uma leitura diária e nela aprendi uma nova respiração de escrita da língua portuguesa. Lê-la na Internet é bom, folheá-la é melhor. Apenas faltam os suplementos…

Petróleo, pois claro

É na Folha que se fala do acordo entre a Petrobras, Braskem e Unipar para que a petrolífera brasileira aumente a sua presença no sector petroquímico brasileiro. A GALP tem interesse nisto?

Chineses por aí

A China e a Europa andam aos beijos. Taiwan, pelos vistos, é o elo mais fraco. Mas talvez convenha pensar numa realidade que o Financial Times referenciava há uns dias: as grandes empresas chinesas, que já podem investir no estrangeiro, estão a comprar imobiliário nos EUA, aproveitando a crise do “subprime”. Dólares e euros não lhes faltam…

29.11.07

A língua bifurcada de Abranhos

Em Portugal continua a pensar-se a língua como um remédio de que só nós temos a fórmula. E isso permite-nos que possamos ganhar dinheiro na nossa mercearia sem que brasileiros, angolanos ou cabo-verdianos façam do português um baile de experiências. Em Portugal continuamos a actuar como o Abranhos de Eça: cobardemente, rastejando, só para termos um quintal rentável. É por isso que a reforma ortográfica causa tantas fricções neste jardim onde o maquiavelismo só tem um objectivo: o “poleiro”.
Porque é que há tantas resistências ao acordo ortográfico? Porque os editores de livros escolares acham que se houver acordo os brasileiros começam também a vender. Isabel Pires de Lima, alma acusada de ser ministra da Cultura, quer uma moratória de 10 anos para haver tempo para mudar. Fora isso o que é que se perde? Nada. A língua portuguesa há muito que deixou de ser nossa: junte-se só brasileiros e angolanos e veja-se onde está a inovação e a capacidade de conquistar novos mercados. Depois, os empresários portugueses têm tudo a ganhar com um acordo: as empresas portuguesas têm um habitat natural ente o Brasil e África.
Uma escrita idêntica favorece acordos. Há 17 anos que se iniciou a discussão. O Brasil preparou-se para a mudança. Em Portugal vivemos de habilidades para não discutirmos o que era visível. Agora, como sempre, dizemos que não temos tempo? Azar. Se Brasil e Angola avançarem para o acordo, podemos ficar a chorar de xaile. À moda do século XIX. Enquanto, lá fora, todos escutam Mariza, com o seu fado dos sete mares.

28.11.07

Airport One

Nos idos dos anos 80 um grupo criou um hit sublime: Airport. Nele os aviões sustituiam barcos, comboios, burros e camelos. Era o início da nova mobilidade. Este país novo rico, com dinheiros que o sr. Mário Lino gere como num casino, (que não são dele, é claro!)tem um sonho: a Ota é a última wild frontier. Vai custar muitos milhões, mas que se lixe, não é ele que paga. E os lisboetas ficam mais longe do mundo. Por mim venha Acolhece, Portela+1 ou +2. Estamos ainda a discutir o aeroporto de Lisboa e não o único hipermecado de aviação do país, não é? Para o Governo o que interessam são os interesses de patos-bravos, de financiamentos de partidos (será, ou é uma teoria da conspiração?) e de interesses dúbios. O resto nada que não se resolva com um imposto...
A propósito de aeropostos o Independent de hoje faz uma lista dos piores aeroportos do mundo. Pergunta: "Porque é que os aeroportos são tão maus? Talvez orque os viajantesnão são cnsumidores mas cativos e os aeroportos exploram-nos sem piedade". Na lista lá vêm Barajas (Madrid), Paris/CDG, Heathrow, Delhi, Jakarta, Baghdad, Los Angeles, Rangon, Moddishu, Gatwick e Moscovo. E a Portela. Olha, não aparece. Mande-se já Mário Lino fazer o seu trabalho para Baghdad ou para Rangoon. Ou mesmo para Barajas...

Olá, estou de volta

Pois bem, fui transplantado há 15 dias. E hoje voltei a casa. Portanto volta a haver voz neste local nómada. A coluna que habitualmente havia diariamente no Jornal de Negócios, vai haver aqui, enquanto estiver de baixa. Já a partir de amanhã.
Mas, olho para o sol lá fora, e o país continua a parecer-me cada vez mais triste. É igual a um fantástico excerto de um livro que li no internamento: "Pânico no Scala" de Dino Buzzati.
Escrevia este mágico da escrita e da BD: "uma lei proibe formalmente que nos ocupemos de montanhas, que não subamos às montanhas, nem fallemos delas e, nem mesmo, eventualmente, as contemplemos. 'Eventualmente' é o que diz a palavra do legislador com uma exigência considerada, pelo próprio, evidentemente, excessiva. Porque as montanhas continuam sempre sobranceiras à cidade, a norte, e dia e de noite, com o seu esplendor".
É Portugal, não?

2.11.07

E agora, Mário Lino?

Mário Lino já disse que vai dar "uma vista de olhos" pelo estudo da CIP sobre a hipótese do aeroporto de Lisboa se situar em Alcochete. Para quem (e, se calhar, ainda está) com os olhos virados para a Meca da Ota, deveria ter um bocadinho de tento na língua. Já se sabe que ele disse que uma decisão destas, será "política" (num país civilizado o ministro já teria sido removido), mas espero que tudo não seja uma cortina de fumo. Para que tantos interesses imobiliários na Ota não se revelem um ganho para uns quantos e um desastre nacional para os cidadãos.

22.8.07

Faz de conta

Portugal é o país do faz-de-conta. Faz-de-conta que tem uma selecção. Na Arménia tropeçou no relvado. No caso do milho transgénico, o ministro da Agricultura tropeçou no apoio juríco ao agricultor e o da Administração Interna no malabarismo jurídico onde se estatelou para demonstrar que contra meia dúzia de garotos pseudo-freaks e "anti-sistema" (que muitas vezes são financiados pelo Estado a coberto de apoio a grupos ecológicos...) a GNR não utilizou os meios de defesa da propriedade. Coisa que, por muito menos, é feita à cacetada, para se dfender a democracia de alguns. É assim que fazemos de conta. Que somos um país. Onde todos somos irresponsáveis e atiramos as culpas para o lado. É a lateralização do futebol e da política.

13.8.07

Tony Wilson, um adeus triste

Foram os Joy Division, os New Order ou a Dutti Column que me influenciaram definitivamente em termos de música. Manchester parecia-me o Barreiro onde vivia e o que poderia um dia ser: um local com história, a que se acrescentavam novos valores. As capas (aquelas velhas capas de discos devinil) de Peter Saville eram de uma beleza única: entre o construtivismo soviético e o futurismo italiano. Mas muito modernas. E havia, claro, Tony Wilson, o maestro da Factory Records, uma das mais radicais editoras de discos de sempre. Tony morreu, agora, triste. Deu tudo à cultura britânica e, em troca, o Serviço Nacional de Saúde, recusou-lhe o dinheiro necessário para tratar da terrível doença de que padecia. Hoje os valores económicos e financeiros vencem tudo o resto. Mas resta o legado do antigo apresentador da Granada Television (e dos seus anos de ouro). Conforme recordou Paul Morley no "Guardian", ele queria cria uma ponte entre a Manchester que Engels visitou no século XIX e a visita, em 1976, dos Sex Pistols. A Factory Records e a discoteca Hacienda era esse elo de ligação, entre o passado industrial radical e o futuro musical que queria mudar tudo. Não cumpriu a sua missão. Mas, durante muitos anos, eu e alguns outros, no Barreiro, julgámos que isso seria possível. Do outro lado do Tejo.

15.7.07

O napalm da vitória

Estive a rever Apocalypse Now de Francis Ford Coppola. Na versão redux. É incrível a modrnidade deste filme. As questões que nos levanta e que ja tinham sido a faísca do trabalho em que e inspira, o espantoso O Coração nas Trevas de Joseph Conrad. Quando passei pelas magens do Mekong, nesse imenso rio que liga o Vietname e o Camboja senti a espiral de memória contra o cheiro do napalm. E que os americanos,que passaram 35 anos antes por lá, nunca conseguiriam vencer. Foi The End para os americanos. Não aprenderam nada: estão no Iraque. Como não tinham aprendido nada com os franceses, encerrados no seu orgulho colonial como se vê neste filme e se sente, depois, no Camboja. O napalm não cheira a vitória. Queima, mas as sementes ficam lá. Para surgirem como vingança que alguém, de outra geração, há-de comer. Kurtz é o Hide do Jekyll que há na nossa civilização. e que nunca percebe que misturar culturas é diferente de subjugar as suas elites.

20.6.07

Que quer Berardo?

Berardo quer tornar o Benfica num CCB? Num Museu de arte moderna? Num "fuck off" de jogadores menos jovens ou numa plataforma giratória como o que parece que desejam Luís Filipe Vieira e José Veiga? Quer investir para ganhar dinheiro no futuro ou comprar porque quer apenas ficar na história do Benfica? Não percebo e acho que ainda não houve muitos a perceber o que se passa. Berardo é a nova águia do Benfica? Os adeptos esperam que assim seja e que, cada vez que esvoace por cima das Luz, caiam notas de euro. Muitas notas. Mas como não há fome que não dê em fartura, o que será do Benfica após a OPA? Pago para ver...

11.6.07

Lino prá Ota!

Mário Lino é um ministro convencido. Foi agora vencido pelo campo de tiro de Alcochete. Mas continua a não se convencer que a sua teimosia em teimar descobrir que as agulhas no palheiro do Sul tinham mais do que camelos. Lino é o alvo do campo de tiro de Alcochete. Este acerta nele em cheio e de ricochete em Sócrates. A CIP ri. Cavaco Silva esfrega as mãos. Só ele continua a sua tonteria kamikaze. Vai estatelar-se na Ota. Mais todos os interesses que ali já aterraram à espera dos lucros, da venda de terrenos ao Estado e dos campos de golfe e de hotéis que já há a sul. O Grupo Espírito Santo e Belmiro (este, por muitas mais razões) riem com o convencimento de Lino. Os seus interesses turísticos, mais sólidos a sul dos que o dos patos bravos da Ota, riem melhor, porque riem no fim. Os lisboetas podem sorrir. E Lino pode muito bem sair no apeadeeiro da Ota. E dizer adeus ao Governo. Já é, apenas, uma anedota enquanto ministro com a pasta da Ota.

Sopranos, arriverdeci!

Nos Estados Unidos, segundo parece, não foi um grande nem um pequeno final. David Chase não escolheu um ciao! à Pilatos nem um assassinato à Júlio César. Os Sopranos acabaram, com um episódio que deixou os fãs dentro do Coliseu da HBO a pedir sangue e os gladiadores deixaram tudo em aberto. Em Portugal vamos ter de esperar mais uns meses para ver a derradeira temporada de Os Sopranos. Tony este à mesa. Como na última ceia. Na mais estimulante série de sempre da televisão (só me lembro de a Jóia da Coroa da Granada Television como tão grandiosa) esperava-se mais, dizem os blogues dos americanos. Estou sequioso. Dos últimos episódios da série de trouxe oxigénio à HBO. E mais paixão à televisão feita de mais do mesmo.

22.5.07

Bjork de volta?

Estava à espera. Afinal Bjork é um uma estrela polar pop. Um meteorito que ilumina, normalmente, os céus da música. Volta, chegou. E, confesso, não foi uma lua nova que ouvi. Foi um quarto minguante. Há aqui bocadinhos de coisas que já escutei dela. E coisas que me recordam A Certain Ratio ou 23 Skidoo do início da década de 80. Ou temas que parece que sobraram de discos antigos dela. Pior: não há uma unidade. Há uma canção de ruptura anti-global: Reclame Independence. Mas para quê gastar tanto dinheiro a fazer um disco, gravado aos bocadinhos nos cantos recônditos do globo e com uma absurda pós-produção? Falta-lhe alma. Falta um rumo. Bjork é, neste disco, uma garimpeira que não descobriu a mina de ouro. De que andará à procura?

8.5.07

This Charming Man

Era esta a grande canção dos Smiths: This Charming Man. Morrissey e Marr escreveram-na há 25 anos, quando o grupo de Manchester iniciou as suas hostilidades melódicas. As capas dos discos, lembro-me, era lindas: de Terence Stamp, de Jean Marais, de Alan Delon. As letras e o som das guitarras eram as de adolescentes que queriam fazer a perfeita canção pop. Lembram-se? Eu lembro-me. De Hand In Glove, de What Difference Does It Make? Os Smiths eram a luz e a sombra. O sol e a noite. Os Smiths eram a magia perfeita. Os Houdini da pop. Vamos voltar a ouvi-los?

26.4.07

Bom dia, Simone


Chamam-se Au Revoir Simone e são a minha última paixão musical. Lembram-me a música pop diáfona dos idos da década de 80, quando se experimentava a melodia misteriosa, cheia de pequenas gotas de ideias e de frases que ecoavam como trovões. O disco tem como título The Bird of Music e poderia ser um rouxinol campestre no som urbano, obsessivo, agreste e corrompido. O meu voto vai para elas. Será que vêm, um dia destes, a Portugal? Estou na fila da frente para as ouvir num palco.

19.4.07

Piercings e recordações

Serpentes e Piercings de Hitomi Kanehara é um livro que nos devora. É o Japão hi-tech que se assemelha às grandes cidades do Oriente que conheço, onde em dias de chuva miudinha e calor, tudo parece Blade Runner. Lembro Hanói com os velhos em banquinhos a comer arroz ao lado de cybercafés, Bangkok sem horas para dormir, Ho Chi Minh City com bares que são modernos como poucos. Este é um livro sobre as tribos urbanas que não se renderam ao trabalho escravo disfarçado de sucesso. Ainda há lugar para Closer da Joy Division. Pouco. Mas fundamental para a vida, mesmo radical, ter sentido.

7.4.07

Foi há 25 anos


Foi em1982. Parece que foi ontem e poderia ter sido. Nas Falklands os britânicos combatiam. Hoje lutam no Iraque. Morrem. Na altura Elvis Costello e Clive Langer escreveram uma das mais belas canções contra a guerra de que há memória: Shipbuilding. A voz de Robert Wyatt dava-lhe alma. Assim:

Is it worth it?

A new winter coat and shoes fo the wife

And a new bicycle on the boy's birthday

It's just a rumour that was spread around town

By the women and children

Soon we'll be shipbuilding

Well I ask you

The boy said, "Dad they're going to take me to task

But I'll be back by Christmas"

It's just a rumour that was spread around town

Somebody said that someone got filled in

For saying that people get killed in

The result of this shipbuilding...

e a voz de Wyatt continuava a cantar o resto do poema. Parece que a única coisa que mudou, 25 anos depois, é que esta canção é uma memória cheia de feridas. Que nunca cicatrizaram.

6.4.07

o xadrez de Sócrates

A licenciatura de Sócrates tornou-se um jogo de xadrez. Dele contra quem o questiona. Mariano Gago e Santos Silva, cada um à sua maneira, são os seus bispos. É claro que o que se está a passar é tão confuso que causa dificuldades aos cidadãos, enquanto espectadores. Habituados a entretenimentos rápidos e que não exijam muita reflexão. Exemplo: o que o ministro Mariano Gago pede para investigar, pelos vistos, é as inúmeras contradições entre as estatísticas oficiais sobre licenciaturas na Universidade Independente, as transferências e as justificações do primeiro-ministro. O comunicado do ministro procura generalizar um caso isolado. O do seu chefe. E manda os seus investigadores investigarem um caso: o do seu próprio pastor. A licenciatura de Sócrates está a tornar-se um pesadelo com pés de barro. Alguém está com medo que a estátua tenha um suporte frágil.

4.4.07

Patrícia no mundo perdido

Patrícia Melo é uma diva da escrita brasileira. Lembra-me, Rubem Fonseca e, claro, o grande Nelson Rodrigues. Nos últimos dias li Mundo Perdido (edição Campo das Letras) que agora foi editado em Portugal. Ainda bem. Há justiça neste mundo. Recordo uma frase: Mas não gosto de pedir favor. De ficar devendo. As pessoas cobram. Mesmo as boas, as que dizem que cuidaram da sua filha. É verdade. O cobrador da vida bate sempre à porta. E cobra a dobrar, acho eu. Patrícia Melo achou a vida. É, nesse aspecto, uma Fernanda Abreu da escrita. As suas palavras soam a banda escrita de Silvinha Telles. Leiam. E escutem o som do Brasil que não é a preto e branco.

26.3.07

A idade do papel

O papel é, segundo nos dizem, uma invenção dos Chineses; a verdade é que não sentimos, face ao papel do Ocidente, outra impressão que não a de estarmos perante uma matéria estritamente utilitária, enquanto nos basta ver a textura de um papel da China ou do Japão, para sentir uma espécie de tepidez que nos faz sentir o coração. Pensamento de Junichiro Tanizaki na idade do sms e da Internet. Para meditar.

15.3.07

Curvatura do círculo

O guru de Tony Blair (para lá do princípe das trevas, Peter Mandelson), Anthony Giddens assina hoje uma prosa no Guardian que Sócrates, e talvez António Costa, devessem ler. Diz ele: eu proponho que o Labour desenvolva um Contrato com o Futuro. O que eu quero dizer com esta frase é que o Labour deve oferecer aos cidadãos para iniciar um futuro para o país. Entre outras coisas Giddens diz que deste coontrato deve fazer parte o regresso à tradição social-democrata; ou seja, um novo egualitarismo. Uma política de inovação e não o aumento de impostos deve ser central neste princípio. Mais poder para as cidades, num mundo globalizado, deve ser outro dos items deste contrato. Mais, para ele, o "wellfare state" deve ser de investimento social. Temas para discussão, num jogo em que, internamente, Sócrates fez do PS um deserto de ideias. De "yes man" que dobram a espinha e perguntam que carta devem jogar quando estão defronte do líder. O PS é hoje a curvatura do círculo. Ganharia muito se debatesse ideias. Digo eu...

14.3.07

Comissários do povo


Um dos estadistas que ficou na história, Benjamin Disraeli, disse que: há três tipos de mentiras - mentiras, mentiras terríveis e estatísticas. A forma como a tutela do Ministério da Cultura afastou, como se fosse lixo, Paolo Pinamonti, é uma inflação de falsidades. Mas adiante: cada um escuta a ópera que deseja, desde que não seja em nome do público contribuinte. O ministério, desde há algum tempo, tem funcionado como patrulha ideológica dos melhores tempos de Estaline: a cultura de massas serve para estrangular tudo o que foge ao gosto hegemónico reinante. Isabel Pires de Lima e Vieira de Carvalho são os comissários do povo da nova cultura proletária e televisiva que torna a vida portuguesa num tédio perfeito.

13.3.07

Contra a pequenez

O ministro da saúde defende o fecho de centros de urgência em locais onde há poucas pessoas. A ministra da educação defende o fecho de escolas onde há poucos alunos. Em Portugal somos contra tudo o que é pequeno. Somos a favor de tudo o que é grande: os maiores centros comerciais da Europa, a maior árvore de Natal do mundo. Para um país tão pequeno temos direito a ministros a mais. Poderíamos dispensar uns quantos. E porque não fechar o país? Alguém notava a falta deste este jardim com 10 milhões de habitantes? Alguém reparou que pequenez também é um sinal de distinção nas maiorias que gerem tudo globalmente?

12.3.07

O grande Steve Canyon


A pouco e pouco tenho estado a recuperar as pranchas e tiras diárias de um dos meus grandes heróis de Banda Desenhada: Steve Canyon. Para alguns era um reaccionário. Para outros, como Hugo Pratt, o excelente Milton Caniff era uma inspiração perfeita. Agora estou a ler as suas aventuras de 1952, que decorrem no Extremo Oriente. O Oriente, palco da sua fascinante BD que era Terry e os Piratas. Como se diz numa tira: não há regras sobre o que fazer em tempos como estes. É verdade. E o Oriente é propício a isso. A Grande Muralha da China clama pelo mistério, pelas sombras e pela sabedoria. Ela é como as árvores sólidas: fica, mesmo quando passam as mais devastadoras tempestades da globalização.

11.3.07

Novas políticas, velha tirania

O mundo está a mudar. A política também. A revista Prospect abriu um debate sobre o que se pode esperar da esquerda e da direita nos dias que correm. Estive a ler, porque quase todos os partidos giram à volta do centro, como em Portugal. Muito inyeressante é a resposta do escritor AS Byatt: somos governados por uma espécie de populismo consensual - ideias, conceitos e políticas crescem nos blogs, nos sites nos "focus groups" e afins (quer Barack Obama e Hillary Clinton anunciaram as suas candidaturas na Internet). Diz ele que isto é assustador, porque leva à tirania das maiorias. E não é verdade?

1.3.07

Os "Good Times" de Portas

Paulo Portas volta como um alquimista de si próprio. Como alguém que se viu do outro lado do espelho e sentiu que tinha novamente de saltar para o lado de lá. Para ficar do lado de cá da política. Portas quer dizer aos portugueses que eles não devem gostar do "show" político que estão a ver. E que devem adquirir bilhetes para o seu regresso ao palco. Portas diz que, na política, a palavra "vanguarda" foi substituída por "revival". Paulo Portas volta a cantar "Good Times", como uma banda que nunca deixou de si imitir a si própria: os Chic. O Bom Tempo da Direita é, para Portas, o seu. Portas só esquece uma coisa: a Direita, na época do centralismo democrático de Sócrates, está fora de moda. É preciso voltar a criar a moda. Portas deve lembrar-se que antigamente estilo significava individualismo. Hoje, na era do consumo, significa escolha. E para centro comercial das escolhas à vontade do freguês já temos Sócrates.

Cinco euros por Jobim

Custou-me cinco euros a biografia de Antonio Carlos Jobim, Um Homem Iluminado. Comprei-o num alfarrabista. Pouco pela história da vida de um genial criador. Tiro de lá um poema. Lindo, pois claro:
"Toda a vez que uma árvore é cortada aqui na Terra,
eu acredito que ela cresça outra vez noutro lugar
- em algum outro mundo.
Então, quando eu morrer;
este é o lugar para onde quero ir.
Onde as florestas vivam em paz.

Que palavras iluminadas por um violão que nunca se calará. Por um nómada do amor.

25.2.07

O ministro embalsamado

O ministro da Saúde é um homem que colocou a cabeça numa corda e a ofereceu a Sócrates. Este mandou-o recuar e dividir para reinar. Fez acordos com algumas autarquias, mais importantes politicamente, e desprezou o diálogo com as outras. Mostrou que é um ministro de palha: com um sorriso feroz por fora e embalsamado por dentro. Correia de Campos tornou-se um ministro sem pasta de Sócrates. Cumpriu a sua missão de Dom Quixote com Manchas. Agora o primeiro-mistro retirou-lhe a pastinha do efémero poder. E lembrar-nos que ele era um "grande ténico" (que até fez um parecer técnico a favor do da desaparecida Caixa dos Jornalistas, quando não era ministro, é claro...). Que recolha ao lugar que lhe é devido: o silêncio. Porque mais não merece. Embora quem é mais do que um número não o devesse esquecer...

A lucidez de John Gray

John Gray é um dos mais lúcidos observadores da actualidade. O professor da LSE, de que a Lua de Papel acaba de editar em Portugal "Sobre Humanos e Outros Animais" (uma análise profunda sobre as fronteiras que aparentemente nos separam de quem não tem e não tem necessidade de fingir que tem códigos sociais), escreveu num dos últimos números da "Spectator" um incontornável artigo sobre a nossa civilização e o Islão. Gray desmistifica a questão dos bombistas suicidas: foi algo já usado há muitos anos pelos tigres tamil, pelos hundus marxistas-leninistas ou pelo Hezbollah nos anos 80 contra alvos argelinos, franceses e americanos. Recorda que o IRA causou mais vítimas inocentes na Grã-Bretanha do que os islamitas. E recentra a questão: o que é que a classe política quer das sociedades muçulmanas? Para ele a ideia que a tolerância leva a uma convergência de valores é uma ficção. E acrescenta: "a sociedade radical plural em que nos encontramos não é transitória rumo a um ponto situado algures no futuro, onde teremos os mesmos valores fundamentais". Vivemos num universo de certezas fast forward. Rápido demais para termos certezas. Como há tanta gente que por aí parece ter.

17.2.07

A pintura do PSD

David com a cabeça de Golias. Foi assim que Caravaggio retratou Roma. E que, talvez, nós pudéssemos utilizar para simbolizar o que se passa na Câmara Municipal de Lisboa. Carmona Rodrigues deixou de se parecer com David. Marques Mendes começa a não conseguir convencer como Golias. E Lisboa cai, mostrando perante a corte de Sócrates, que a oposição não sabe galgar a montanha do poder. Mendes deveria deixar cair Carmona para salvar, para o futuro, o PSD. Mas não. Segura o autarca e fica em défice com os lisboetas. Que costumam dar os trunfos da vitória nacional ora ao PS, ora ao PSD. Como retrataria Caravaggio o choro do moribundo Carmona Rodrigues que Mendes salva, em troca de uma sentença de morte futura? Como uma Madonna que se atira para o meio dos lobos, sabendo que o seu destino está escrito pelos deuses? No meio da tragédia, só alguém sorri com a matança: Santana Lopes. Quem diria?

Memórias infinitas

Gosto de ler livros sobre o passado. De países, de pessoas, de acontecimentos. Por isso não posso deixar de ficar a pensar num belo texto de Raúl Rivero no "El Mundo" de hoje. Sobre o escritor turco Orhan Pamuk. Como é abandonar Istambul, levar na bagagem a memória fragmetada dos cinco sentidos da vida, isto tudo para ser livre e convervar a vida? Como é estilhaçar o nosso passado e tentar colocar os cacos num outro mundo, que poderá ter outros espinhos? Ler Pamuk é entender isso, em cidades que foram zonas francas entre mundos diferentes. E que hoje colocaram minas debaixo dos pés de quem trocava ali ideias. Livremente.

10.2.07

Império interior

Vivemos numa época em que as próprias ideias andam em fast-forward. Não vivem o seu tempo real. Poucos reflectem sobre isso. David Lynch é um deles. Um sobrevivente. Os seus filmes são jogos de roleta russa da imaginação. Cada imagem é uma bala que pode abater as nossas certezas. Agora tem um novo filme, Inland Empire. Numa sua entrevista fala dos momentos em que gosta de fechar os olhos, algumas vezes por dia. Para escutar um som ou sentir uma vibração. E confessa: eu transcendo vinte minutos de manhã, vinte minutos depois de almoço e tudo melhora. Gostava de ser como Lynch. Só assim se poderia criar Twin Peaks ou Mulholand Drive. Viagens em busca do lusco-fusco das sombras da mente.

6.2.07

Púdicas virtudes

"Pecados Íntimos" é um filme sobre a guerra civil que dilacera o interior dos seres humanos. Não há aqui "fogo amigo": todos são atingidos pelas balas de recentes paixões, de velhas amarras, de falsas inocências e de culpas que não se limpam com o passar do tempo. Todos se queem libertar. Mas há quem arrisque. E há quem se esconda. O realizador Todd Field traz-nos um filme que é uma mina colocada debaixo de todas as nossas certezas. Apetece revê-lo. E ver Kate Winslet, despojada, sem medo do seu corpo e das suas rugas. As virtudes podem aqui ser púdicas. Mas a privacidade está lá. Com cicatrizes de todas as culpas.

29.1.07

Rumo ao céu

Crise, há alguma crise? Todos, do Governo à leal oposição, poderão perguntar isso, enquanto fazem uma sesta. As sondagens dizem tudo: a popularidade do Governo cai, a do PSD também. A audiência não gosta da telenovela política actual, mas para ela os actores são todos fracos. Afinal Portugal é um país de equilíbrios. Na pobreza somos todos mais pobres do que a galinha dos nossos vizinhos. Por isso se costuma dizer: pobres, mas honrados. Excepto, claro, os que enriquecem através dos negócios imobiliários ou dos "esquemas" tipicamente portugueses.
Isso faz lembrar uma velha história: os arranha-céus, quando surgiram nos EUA, não eram símbolos de inteligência, como imaginavam alguns europeus quando lá chegaram. Mas sim de poder e de busca de riqueza. Os americanos queriam estar próximos do céu, dos deuses. Em Portugal esses símbolos são carros de marca famosos, pavilhões gimno-desportivos e rotundas. Cada país mostra a sua noção de glória. E dos deuses que querem imitar.

22.1.07

O preço e o valor

O povo, geralmente, procura líderes políticos que não se limitem a diagnosticar os males da sociedade. Quer que eles proponham a cura. Os cidadãos de Odemira talvez gostassem de ver o ministro da Saúde a viver longe dos centros urbanos. Onde fazer contas não é tão fácil. O mais difícil é que elas resolvam alguma coisa no maior concelho do país, cujos habitantes ficam longe dos centros de decisão.
Oscar Wilde descrevia um cínico como alguém que “sabia o preço de tudo e o valor de nada”. O ministro da Saúde sabe o preço de ter serviços na periferia. Não sabe o valor de algumas coisas que eles poderiam resolver num concelho longínquo. Leu pouco Oscar Wilde e muito Milton Friedman. Assim não escuta os gritos da população que sente o que é esperar horas infinitas por uma ambulância que pode salvar uma vida. Daí a insensibilidade urbana aos mortos que se vão sucedendo em Odemira.

Promessas bonitas


Foi apenas uma cara bonita. Hoje é um exemplo do estilo de quem se sabe adaptar às rugas e à idade. Falo de Carla Bruni, que lançou um novo álbum de canções “No Promises”. Como diz ela: “entre as promessas não continuadas e a não existência delas, prefiro as primeiras”. E o que ela canta, num clima muito circunspecto, é o louvor ao que se promete e que necessitamos de acreditar para continuar a viver.

16.1.07

Os gnomos portugueses

Os gnomos são os seres que sabem. Os portugueses têm dúvidas sobre se o Estado sabe o que deveria controlar. Porque é que o 112 está uma hora inactivo em grande parte do país e ninguém repara ou procura saber? Porque é que um homem demora seis horas a chegar de Odemira a Lisboa e morre porque na idade do simplex os apoios primários são complex? Porque é que o IPO, em vez de estar em Lisboa, vai parar aos arredores?O Governo gosta que os portugueses sejam alunos bem comportados. E que não coloquem questões incómodas. Mas isso tem a ver com a relação dos políticos modernos com a comunicação social. Antigamente eles mantinham a distância e ninguém os questionava muito.
Quando chegou o Spitting Image à Grã-Bretanha e o Contra-Informação à portuguesa, os políticos surgiram como bonecos manupuláveis. Tornaram-se vulneráveis. Foi assim que se tornaram actores e que passaram a tratar os eleitores como uma plateia. Deixaram de ser gnomos. Passaram a ter autoridade que lhe foi facultada pela comunicação social. Por isso fogem às questões. Abafam-nas. Afogam-nas. E a oposição, no desejo de ser um anão sabedor no lugar do gnomo, cala-se e consente. Por isso as questões ficam sem resposta.

13.1.07

Uma centena de portugueses

Os portugueses gostam do Guiness Book de records. Adoram ter a maior árvore de Natal do mundo. Os maiores torresmos da Península Ibérica. E mesmo o melhor treinador de futebol do universo. Compreende-se. Temos de fazer um fogo de artifício com qualquer coisita. É assim que a escolha dos 100 grandes portugueses se tornou uma santa missão. A lista dos escolhidos é confrangedora: ilustra o vácuo do país pacientemente criado ao longo dos últimos séculos. Depois de termos corrido a pontapé os intelectuais e os capitalistas para a Holanda, de onde estes emigraram para a Grã-Bretanha que se tornaria um verdadeiro Império, ficámos um país criado a pão, vinho e a uma qualquer 4ª Classe mal tirada.
Isso exemplifica a nação de educação pobre e televisiva que é o Portugal deste início do século XXI. A lista mostra isso: os políticos escolhidos ou foram ditadores ou aprendizes disso. Ou são simplesmente incompetentes com razoável imagem televisiva e que surgem nas perguntas de cultura geral do "Um Contra Todos". Os homens e mulheres da cultura são os que aprendemos na escola obigatória. Surgem como artistas uns rapazes que aparecem no pequeno ecrã, a começar por um de uma telenovela. A música, cinema e teatro estão representados pelo mínimo denominador comum. É um país pobre, educacional e culturalmente, o que os portugueses escolheram para o representar. Mas talvez ele seja o símbolo de Portugal destes últimos três ou quatro séculos. Um imenso deserto.

11.1.07

Loja gourmet

O Governo tornou-se uma mercearia fina: acha que o país deve ser uma loja de conveniência com aspecto de gourmet. Por isso preza a eficiência e clama que se há gente a mais ela devia ser dispensada. A retórica governamental é bonita, mas é pena não a aplicar. Um administrador da CP andou cinco anos sem ter nada que fazer e a receber o seu soldo. Parece que o único problema do país são os que ganham magros salários. Manuel Maria Carrilho saíu da Câmara de Lisboa, porque tem não sei quantos cargos políticos e não sobra tempo para se dedicar a todos. Surge como um sofredor, embora tudo estivesse combinado dentro do PS há muitos meses. Pelos vistos não há gente a mais: existem são cargos insuficientes para algumas pessoas. E, noutros casos, dinheiro em excesso. E viva o combate ao défice, pois claro!

9.1.07

O vírus da simpatia

A nova política governamental é a simpatia. O ministro da Saúde sente simpatia pelos jovens médicos que deveriam ter sido colocados nos hospitais. E que, devido a um alegado erro informático, estão simpaticamente à espera. O ministro da Saúde criou o vírus da simpatia. Sorri contra as calinadas do seu Ministério, mas elas continuam por resolver. Quem também deve ter muita simpatia pelo Ministério da Saúde são os funcionários e utentes do hospital Curry Cabral que têm de percorrer acessos cheios de buracos típicos de uma unidade hospitalar do Terceiro Mundo. Mas como tudo se resolve com simpatia…

Velha Chicago

Um livro cintilante é Chicago Pimp de Iceber Slim. O velho mundo da cidade americana, muito anos antes do rap ter conquistado os seus dias e onde os chulos eram mais importantes do que os DJs. Uma obra seca e dura. Para conhecer o lado underground da vida que não vem nos filmes.

7.1.07

50 metros de distância

Portugal é um país sedento de contabilistas. Fazem contas terríveis. Como por exemplo: a que percentagem estamos do défice ideal. Ou: a quantos metros é preciso estar da costa para que um helicóptero salve seis pescadores. A nossa indigência à cantada à velocidade de um fado. Ou, como quem diz, muito devagarinho. O xaile é a indumentária dos portugueses: o seu prêt-à-porter. A infelicidade dos portugueses, a sua incapacidade para resolver duma vez por todas os seus dislates, é resolvida por diversas Disneylândias de trazer por casa. Seja os cartões de crédito, no caso dos cidadãos, sejam as comissões de inquérito que nunca chegam a conclusões, por parte do Governo. Em Portugal, Governo e cidadãos chocaram cada um à sua maneira o seu colesterol. Ficamos a 50 metros de salvar vidas. Ficamos a 50 metros do desenvolvimento. Nunca lá chegamos a tempo e horas. Mesmo com as chamadas “sociedades da tecnologia”.

2.1.07

O Maquiavel dos resultados

Cavaco exige resultados. Porque de promessas estão os ouvidos dos portugueses cheios. A política, sabe-se, é um conjunto de boas intenções que se esvaem à boca das urnas. O dilema maior de José Sócrates é o jet lag entre as suas promessas e aquilo que, no fim, será cumprido. Poucos políticos resistem aos ensinamentos de Maquiavel: a liderança pode prescindir dos escrúpulos, mas na altura do voto, o som melodioso das harpas dos votos soará mais alto. Que decidir? Conseguirá Sócrates ser o Maquiavel dos resultados políticos? Com vícios privados e públicas virtudes?
Governar pode ser, para Sócrates, um exercício de relações públicas, mas a política nesta altura do campeonato europeu, exige atitudes que levem à resolução dos problemas. Portugal é um país com muito jeito para fintar, mas tem pouca massa muscular. E, no mundo da economia cruel, o circo ilude uma ou duas vezes. Mas, à terceira, tudo começa a parecer falso. E leva, inevitavelmente, um país ao cadafalso.

Melodia da guerra

Por estes dias apetece voltar a ouvir uma das mais belas canções sobre a guerra de que tenho memória: Shipbuilding, de Elvis Costelo e Clive Langer. Cantada por Robert Wyatt, em 1983, sobre o conflito das Falklands, mostra como a melodia pode ilustrar o som dos tiros. Algo que nos leva a pensar no Iraque e nas verdadeiras razões que levaram à morte apressada de Saddam Hussein, como bem explicava Robert Fisk no Independent há dias: sabia demais.

1.1.07

Terceira via para a pobreza

Chegou 2007. E o Governo, depois de nos convidar a comer passas, como prazer, mostra-nos que os portugueses vão passar as passas da vida. Sócrates descobriu a Terceira Via para o sofrimento: é uma auto-estrada entre o capitalismo e o socialismo onde quem quer ter saúde ou educação paga impostos ao Estado e gasta mais uns trocos no sector privado para ter direito a um serviço. Isto é: paga duas vezes a mesma coisa.
Dou dois exemplos: o ministério da Educação fecha escolas no interior do país porque não há alunos. Em Lisboa, como os há a mais, ficam em lista de espera durante um ano ou dois para terem um local onde o Estado cumpra a sua educação. Se não tiver com vontade de esperar, vá até ao ensino privado.
Brevemente, segundo disseram a um vizinho meu, o serviço de neurologia do Hospital Dona Estefânia vai apenas estar em funcionamento no período diurno. Como ele tem uma filha com epilepsia, se esta tiver uma crise durante a noite, terá de ficar à espera de um especialista que só chega às oito da manhã. Segundo a tese do ministério da Saúde, um enfermeiro resolve o problema: com umas drogas que aliviam o sofrimento. Fantástico, não?

Tudo é espectáculo

A história da cultura urbana fez-se com movimentos como a Internacional Letrista (base da conhecida Internacional Situacionista), que editou uma série de boletim de agitação e propaganda na década de 50 do século XX. Muita da análise sobre a importância dos meios de comunicação social já estão neste Potlatch, conjunto de textos agora editados em Portugal. Uma oportunidade para reler o fundamental A Sociedade do Espectáculo de Guy Debord, que fez parte de ambos os movimentos. Foi ele que escreveu: A sociedade proclamou-se oficialmente espectacular. Ser conhecido à margem das relações espectaculares equivale já a ser conhecido como inimigo da sociedade. E não é isso que está a acontecer?

Folk melódico


A folk britânica já teve o seu apogeu. Houve uma época dourada, onde as raízes célticas e a electricidade se uniram e o resultado foram grupos como Fairport Convention, Steeleye Span ou Pentangle. Bert Jansch, um guitarrista escocês, foi um dos expoentes de uma fusão sonora que ainda apetece continuar a ouvir vezes sem conta. Agora, aos 63 anos, regressa com o álbum Black Swan, com o auxílio de nomes como Beth Orton ou Devendra Banhart. São temas melancólicos e misteriosos que escutamos aqui. Com renovado prazer.